Foram registradas ainda, 5.253 internações provisórias, que duram 45 dias, e são aplicadas apenas em casos de cometimento de delitos graves e gravíssimos. O que quer dizer, que o número de adolescentes envolvidos com homicídios, sequestros, latrocínios e que reincidem na prática de delitos é alto.
Para o juiz titular da 5ª Vara de Execuções da Infância e Juventude de Fortaleza, Manuel Clístenes de Façanha e Gonçalves, os índices são absurdos. Segundo ele, em muitos casos, as internações provisórias decorrem das falhas na aplicação das medidas de Meio Aberto. "Eles se dirigem uma vez por mês a um Creas, instalado em cada uma das Regionais e assinam que estiveram presentes. Isto deveria ser totalmente diferente. Era para haver uma acompanhamento psicossocial para toda a família e haver uma série de atividades de cultura, lazer, arte".
O juiz disse que a situação é caótica e que as medidas não têm surtido efeito algum para os adolescentes, que transgridem às leis. "Este levantamento mostra que praticamente 100% dos garotos descumprem as medidas de Meio Aberto. Isto é uma piada. É uma prova de que a Liberdade Assistida não funciona em Fortaleza. O resultado é absolutamente nulo".
O número de procedimentos que chegam à Justiça ligados à atos cometidos por adolescentes é cada vez maior. Em 2012, foram abertos 2.750 processos contra menores, somente na 5ª Vara; em 2013, foram 4.486; e neste ano, já são 1.482. Os envolvidos nos autos, segundo funcionários do Juizado, são praticamente todos viciados em drogas.
"A situação destes meninos é triste. Muitas vezes o caso deles é para tratamento e não para internação. Como não dispomos de clínicas que possam tratá-los, os enviamos para os Centros Educacionais, por terem praticado delitos voltados unicamente para alimentar o vício", disse Clístenes.
Roubo de veículo
Dados da 5ª Vara dão conta que os delitos mais cometidos no ano de 2013 foram o roubo, o tráfico e o porte ilegal de arma. Neste ano, o magistrado deste Juizado, diz que percebeu um aumento acentuado no número de roubos e receptações de veículos. "Estamos recebendo uma média de três a quatro acusados de roubar ou receptar veículos por dia. As motos são mais recorrentes. Os infratores estão sofisticando suas atividades. Apreendemos com eles equipamentos que servem pra bloquear rastreadores".
Clístenes Gonçalves informou que quem comete este tipo de infração é internado, por 45 dias. "Este é um ato grave, que denota grande perigo. A maioria dos latrocínios, por exemplo, acontecem durante tentativas de roubos de carros".
Polícia
O delegado-geral da Polícia Civil, Andrade Júnior, disse que a maioria esmagadora dos procedimentos realizados pela Instituição envolve adolescentes, seja como autores, seja como comparsas de adultos. Segundo o delegado, no ano de 2012, 5.953 procedimentos de auto de apreensão em flagrante de adolescentes foram lavrados no Estado Ceará; em 2013 foram 8.397; e de janeiro a abril deste ano, já são 2.933.
"Nada fala melhor que estes números, que mostram que cada vez mais menores estão no mundo do crime. É necessário que se faça um trabalho com as famílias e nas escolas das pessoas que vivem em situações, que as torna vulneráveis a serem cooptadas pelos criminosos, enquanto elas ainda são crianças".
Sobre o alto número de roubos de veículos, Andrade Júnior disse que a delegacia especializada nesses casos vem mapeando as áreas de maior incidência de ocorrências e repassando para a PM. "Há uma explicação fácil para que mais motos sejam roubadas. Elas são mais ágeis no varejo do tráfico; nos crimes contra o patrimônio, como roubos; e também nas execuções. Em todos estes delitos detectamos grande envolvimento de menores".
FIQUE POR DENTRO
O que são Medidas de Meio Aberto?
As Medidas de Meio Aberto estão previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e devem ser determinadas por um juiz. O magistrado deverá levar em conta em sua sentença, a capacidade do adolescente em conflito com a lei de cumprí-la, as circunstâncias e a gravidade da infração que ele cometeu.
Estas medidas são duas, a Prestação de Serviço à Comunidade (PSC) e a Liberdade Assistida (LA). A PSC está prevista no Artigo 117 do ECA, e consiste "na realização de atividades gratuitas de interesse geral, por período não excedente a seis meses, junto a entidades assistenciais, equipamentos de educação, saúde entre outros, por parte do adolescente". Os menores que podem ser beneficiados por esta medida são os que cometeram delitos considerados leves.
A Liberdade Assistida está prevista no Artigo 118 do ECA, que estipula que ela deve ser aplicada se "afigurar a medida mais adequada para o fim de acompanhar, auxiliar e orientar o adolescente". A L.A. Deve ser fixada pelo prazo mínimo de seis meses, pode a qualquer tempo ser prorrogada, revogada ou substituída e não pode ser aplicada em casos de cometimento de delitos graves ou de práticas reiteradas do infrator.
O acompanhamento destas, é feito pelos Creas de cada Município. Os órgãos devem oferecer acompanhamento psicossocial e educacional para os adolescentes que estiverem inseridos na condição de infrator.
Dependência química torna jovens propensos a delitos
O problema das drogas que se alastra entre os jovens e já se configura como epidemia, devia ser tratado como um problema de saúde pública, conforme a professora-doutora, Jânia Perla Aquino, do Laboratório de Estudo da Violência, da Universidade Federal do Ceará (LEV/UFC). Para ela, o contingente de adolescentes dependentes químicos é tão alto, que parte de uma geração foi perdida, para o que ela considera uma patologia.
A professora afirmou que as políticas de atendimento aos adolescentes têm sido ausentes e as medidas aplicadas a eles precisam ser revistas. "O Estado tem um equipamento para prendê-los e não tem para tratar. É muito caro manter uma pessoa presa e mesmo assim, não se leva em conta que este dinheiro pode ser gasto em políticas de tratamento e prevenção".
A pesquisadora considera que o vício das drogas, que desencadeia outros crimes, é um problema que vem sendo sentido pela sociedade em geral. "A população sente isso de forma dramática. Parece haver uma relação entre o uso das drogas e os assaltos e latrocínios, por exemplo. Se a pessoas está drogada, não há possibilidade de negociação com a vítima, não há cuidado, não há preocupação com o futuro. Ela simplesmente age. As pessoas têm medo desta figura, que não faz mal só a si mesmo, mas aos outros".
Desfecho
Jânia Perla disse que o desfecho para estes viciados são trágicos, na maioria das vezes. "Por estarem inseridos no mundo do crime, eles também acabam sendo muito vulneráveis a serem mortos. Existe um processo de desumanização dos jovens que estão na condição de dependentes pela sociedade, que legitima a morte deles. Pouquíssimos destes casos são investigados e elucidados pela Polícia. As execuções não são tidas como perdas, mas como alívio". A professora disse que o tratamento dos dependentes e as políticas de prevenção para que adolescentes se afastem da criminalidade, estão entre as demandas sociais mais urgentes do Estado. "Estes jovens pobres, negros, da periferia, dependentes químicos são os que mais morrem e mais matam".
Creas amplia equipe de atendimento psicossocial
Diante da denúncia de que as equipes de atendimento psicossocial dos seis Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas) de Fortaleza, não estariam oferecendo o serviço adequado aos adolescentes que cumprem medidas em Meio Aberto, feita pelo representante do Poder Judiciário, a Secretaria de Trabalho, Desenvolvimento Social e Combate à Fome (Setra), responsável pelos Creas, informou que "atualmente acompanha 1.139 adolescentes".
A instituição informou ainda, que "as equipes profissionais estão completas, atendendo as demandas e fazendo os acompanhamentos necessários". A assessoria de comunicação disse ainda que "a Prefeitura de Fortaleza, realizou uma seleção pública para a área da Assistência Social. No total, foram ofertadas 242 vagas para as especialidades de nível superior - Serviço Social, Direito, Psicologia, Pedagogia, Terapia Ocupacional - e 111 vagas para a especialidade de nível médio - Educador Social. Os profissionais selecionados já estão atuando, desde o início deste mês, junto às equipes".
Fugas de internos são recorrentes
A situação de reincidência e descumprimento das medidas de Meio Aberto acabam sendo um fator que influencia na superlotação dos Centros Educacionais. O inchaço da população nas unidades vem sendo percebido e é um desafio para as autoridades que cuidam dos Centros.
Neste ano, um movimento considerado atípico pelos coordenadores das unidades começou a ocorrer: as tentativas de fuga. Somente neste mês, dois movimentos deste tipo, de grandes proporções ocorreram.
Um aconteceu no Centro Educacional Dom Bosco, no último dia sete. Ao todo, 12 adolescentes em conflito com a lei conseguiram escapar, depois de danificar grande parte da estrutura do prédio e provocar um incêndio.
A maior das fugas aconteceu um dia depois, no último dia oito, no Patativa do Assaré. Na ocasião, 64 infratores conseguiram escapar. Alguns deles foram recapturados e outros voltaram voluntariamente, mas pelo menos, 40 ainda estão sendo procurados pela Polícia.
Vistorias
Na última semana, uma comissão formada por integrantes do Poder Judiciário, do Ministério Público Estadual (MPE) e da Defensoria Pública realizarão a primeira vistoria em conjunto, nos Centros Educacionais. A priori, o Patativa do Assaré, o Dom Bosco e o Dom Aluísio Lorscheider (Cecal) serão atendidos.
Quesitos como superlotação, acomodação dos internos e qualidade dos serviços prestados a eles serão analisados. Relatos de menores, dão conta que após se rebelarem, tiveram que beber água do chuveiro, em uma das unidades. Os Centros de internação têm capacidade para 60 pessoas e chegam a abrigar o triplo disto. Todos estão lotados.
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