Uma das personalidades mais controversas da história da religiosidade brasileira nasceu no Ceará e, hoje, completa 169 anos. Cícero Romão Batista, o padre que chamou a atenção da Igreja Católica por defender a certeza de um fato extraordinário, em 1889, e adotar a causa da religiosidade sertaneja, foi afastado de ordens em 1891, mas não deixou de ser aclamado pelo povo até hoje, como santo.
O sofrimento vivido neste período foi a grande travessia silenciosa enfrentada por Cícero, segundo o contemporâneo do sacerdote, o escritor Geraldo Barbosa, de 88 anos. Ele lembra dos momentos em que via Padre Cícero na janela da casa da Rua São José, no Centro da cidade, atender visitantes que chegavam de várias partes do Nordeste. Isso, principalmente, depois que a notícia do milagre do sangramento da hóstia, na boca da beata Maria de Araújo, se espalhou mundo afora.
Hoje, nem se fala tanto no ´milagre´ original, mas em milagres, demonstrando que o santo ´padrinho´ está na fé dos milhões de sertanejos nordestinos. É uma palavra doce, em meio a amargura da seca para o homem simples do sertão. Mas a importância de preservação da história de Juazeiro e de seus personagens passou a ser uma preocupação para os estudiosos, que acompanham há décadas o desenrolar de uma história, que, ainda hoje, arrasta levas de romeiros para Juazeiro do Norte.
Padre Cícero nasceu em Crato, no ano de 1844, e pouco tempo depois de ser ordenado padre, foi encaminhado para o pequeno povoado de Tabuleiro Grande. Juazeiro ainda não existia como cidade. Ele foi um dos personagens que mais influenciaram a criação e independência do Município.
O Padre Cícero sempre gostou de comemorar o seu aniversário. Tanto que festejou os seus 90 anos com grande festa na cidade. Nesse dia, foi feriado e começou com uma alvorada festiva e show pirotécnico, além de um almoço servido em sua casa.
Padre Cícero atendia visitantes que chegavam de várias partes do Nordeste. (Foto: Agência Miséria)
Os comerciantes de Juazeiro, por exemplo, preferem abrir no dia 19 (São José) e fechar no dia 24. Para o secretário de Cultura e Romaria de Juazeiro, Wellington Costa, não há uma personalidade maior do que essa na cidade. "É um motivo para sempre se comemorar por quem mais fez por esta terra".
O dia 24 de março passou a ser um feriado, com direito a bolo gigante. Os parabéns e o apagar das velas para o aniversariante acontece pouco depois da meia-noite. Uma demonstração de que ele está bem vivo no coração do povo e dos romeiros.
Mas, além disso, o escritor Geraldo Barbosa, vai mais adiante, quando fala do Padre Cícero como uma bandeira do catolicismo no Nordeste. Ele, como tantos outros nomes que estudam sobre Padre Cícero, as romarias, e os fatos extraordinários de Juazeiro do Norte, acreditam que o papa Francisco possa abrir portas para o reconhecimento e uma valorização do ´padrinho´ nordestino. A razão é por o sumo pontífice ser um latino-americano, com visão franciscana.
Segundo a irmã Anette Dumoulin, pesquisadora desde meados de 1970 sobre os fatos de Juazeiro, a realidade do Padre Cícero e a escolha da causa pelos pobres poderiam sensibilizar o papa, que conhece cardeais brasileiros. "Tudo isso indica que ele possa ter um olhar mais compreensivo com o Padre Cícero", diz ela.
Série de eventos
E longe dos olhares de Roma, o povo de Juazeiro e do Cariri está em festa. Durante o dia de hoje, acontecem várias comemorações com maratona, campeonato, e centenas de atletas da região e vários estados participam das competições. Uma missa foi celebrada logo cedo. No final da tarde, acontece a procissão das flores, com a Sociedade Padre Cícero, que há seis décadas realiza o evento, pelas ruas da cidade, até a Capela do Socorro, onde estão os restos mortais do homem que passou a ser o maior referencial de Juazeiro.
Junto do Padre Cícero, há outros dois grandes personagens que devem ser considerados, segundo os historiadores. Um seria a própria beata Maria de Araújo, protagonista do milagre e, até hoje, a mulher sem túmulo. Em maio, se passam 150 anos da história de vida e morte da religiosa.
O professor e presidente da Fundação Memorial Padre Cícero, Antônio Chessman, fala da reparação que deve ser feita a essa importante personalidade. Será realizado um seminário, com estudos voltados para a participação da beata dentro de todo esse contexto histórico de Juazeiro, e numa pedra de granito, será gravado o nome da religiosa e colocado no cemitério do Socorro, próximo à capela.
Floro Bartolomeu
Já em relação ao médico, advogado, orador, e segundo Geraldo Barbosa, um exímio administrador, está sendo providenciada transferência dos restos mortais (cinzas) de um cemitério de Salvador, na Bahia, estado de origem do médico, também para ser sepultado no Socorro, próximo ao túmulo do "Padrinho".
O escritor destaca a grande influência e luta de Floro Bartolomeu por Juazeiro e ao lado do Padre Cícero, como braço direito e homem de grande influência política, que extrapolou as fronteiras do Estado, na luta por causas locais. "Essa seria uma homenagem a um grande baluarte, ao lado do Padre Cícero".
As romarias de Juazeiro, após 79 anos de morte do Padre Cícero, continuam acontecendo e multidões não deixam de vir para a cidade. Mas, a irmã Anette faz o alerta para não transformarem esse grande cortejo de religiosidade, com uma originalidade singular, em turismo. "O romeiro não é um objeto, mas um sujeito das romarias de Juazeiro", diz ela, como uma profunda conhecedora da realidade dos romeiros
Até hoje, se aguarda a possibilidade do reconhecimento do Padre Cícero pela igreja. Em maior de 2006, o pedido de reabilitação formal foi entregue pelo bispo dom Fernando Panico, em Roma, acompanhado de uma comitiva do Brasil. Até hoje, nenhuma resposta foi dada sobre a questão.
No dia 20 de cada mês, data tradicional das missas do Padre Cícero, que faleceu em 20 de julho de 1934, aos 90 anos, milhares de pessoas comparecem às 6h para a celebração. Na última quinta-feira não foi diferente. Uma multidão, mesmo debaixo de chuva, não deixou de ir.
Segundo o pesquisador e escritor, Daniel Walker, todo dia 20, a grande multidão de devotos vai ao Socorro para assistir à missa do Padre Cícero. "É uma expressiva demonstração de fé a uma pessoa santa, um padre virtuoso que morreu com a punição de suspensão das ordens declarada pela Igreja, da qual nunca se afastou", diz.
Para Daniel, ele está canonizado pelo povo e a própria Igreja sabe disso. "Ela não é cega", afirma. Até hoje, segundo ele, seus devotos esperam ansiosamente pela sua reabilitação, cujo processo se arrasta na burocracia do Vaticano. "Pode ser que agora, com o novo Papa, surja uma nova esperança", aposta.
"Padre Cícero é uma das personalidades mais festejadas que conheço. Até no aniversário de morte, dia 20 de julho", diz.
Mais informações:
Secretaria de Cultura e Romaria de Juazeiro do Norte.
Rua Santo Agostinho, Centro, em Juazeiro do Norte
Telefone: (88) 3512.3380
AUTOR: DN
Os comerciantes de Juazeiro, por exemplo, preferem abrir no dia 19 (São José) e fechar no dia 24. Para o secretário de Cultura e Romaria de Juazeiro, Wellington Costa, não há uma personalidade maior do que essa na cidade. "É um motivo para sempre se comemorar por quem mais fez por esta terra".
O dia 24 de março passou a ser um feriado, com direito a bolo gigante. Os parabéns e o apagar das velas para o aniversariante acontece pouco depois da meia-noite. Uma demonstração de que ele está bem vivo no coração do povo e dos romeiros.
Mas, além disso, o escritor Geraldo Barbosa, vai mais adiante, quando fala do Padre Cícero como uma bandeira do catolicismo no Nordeste. Ele, como tantos outros nomes que estudam sobre Padre Cícero, as romarias, e os fatos extraordinários de Juazeiro do Norte, acreditam que o papa Francisco possa abrir portas para o reconhecimento e uma valorização do ´padrinho´ nordestino. A razão é por o sumo pontífice ser um latino-americano, com visão franciscana.
Segundo a irmã Anette Dumoulin, pesquisadora desde meados de 1970 sobre os fatos de Juazeiro, a realidade do Padre Cícero e a escolha da causa pelos pobres poderiam sensibilizar o papa, que conhece cardeais brasileiros. "Tudo isso indica que ele possa ter um olhar mais compreensivo com o Padre Cícero", diz ela.
Série de eventos
E longe dos olhares de Roma, o povo de Juazeiro e do Cariri está em festa. Durante o dia de hoje, acontecem várias comemorações com maratona, campeonato, e centenas de atletas da região e vários estados participam das competições. Uma missa foi celebrada logo cedo. No final da tarde, acontece a procissão das flores, com a Sociedade Padre Cícero, que há seis décadas realiza o evento, pelas ruas da cidade, até a Capela do Socorro, onde estão os restos mortais do homem que passou a ser o maior referencial de Juazeiro.
Junto do Padre Cícero, há outros dois grandes personagens que devem ser considerados, segundo os historiadores. Um seria a própria beata Maria de Araújo, protagonista do milagre e, até hoje, a mulher sem túmulo. Em maio, se passam 150 anos da história de vida e morte da religiosa.
O professor e presidente da Fundação Memorial Padre Cícero, Antônio Chessman, fala da reparação que deve ser feita a essa importante personalidade. Será realizado um seminário, com estudos voltados para a participação da beata dentro de todo esse contexto histórico de Juazeiro, e numa pedra de granito, será gravado o nome da religiosa e colocado no cemitério do Socorro, próximo à capela.
Floro Bartolomeu
Já em relação ao médico, advogado, orador, e segundo Geraldo Barbosa, um exímio administrador, está sendo providenciada transferência dos restos mortais (cinzas) de um cemitério de Salvador, na Bahia, estado de origem do médico, também para ser sepultado no Socorro, próximo ao túmulo do "Padrinho".
O escritor destaca a grande influência e luta de Floro Bartolomeu por Juazeiro e ao lado do Padre Cícero, como braço direito e homem de grande influência política, que extrapolou as fronteiras do Estado, na luta por causas locais. "Essa seria uma homenagem a um grande baluarte, ao lado do Padre Cícero".
As romarias de Juazeiro, após 79 anos de morte do Padre Cícero, continuam acontecendo e multidões não deixam de vir para a cidade. Mas, a irmã Anette faz o alerta para não transformarem esse grande cortejo de religiosidade, com uma originalidade singular, em turismo. "O romeiro não é um objeto, mas um sujeito das romarias de Juazeiro", diz ela, como uma profunda conhecedora da realidade dos romeiros
Até hoje, se aguarda a possibilidade do reconhecimento do Padre Cícero pela igreja. Em maior de 2006, o pedido de reabilitação formal foi entregue pelo bispo dom Fernando Panico, em Roma, acompanhado de uma comitiva do Brasil. Até hoje, nenhuma resposta foi dada sobre a questão.
No dia 20 de cada mês, data tradicional das missas do Padre Cícero, que faleceu em 20 de julho de 1934, aos 90 anos, milhares de pessoas comparecem às 6h para a celebração. Na última quinta-feira não foi diferente. Uma multidão, mesmo debaixo de chuva, não deixou de ir.
Segundo o pesquisador e escritor, Daniel Walker, todo dia 20, a grande multidão de devotos vai ao Socorro para assistir à missa do Padre Cícero. "É uma expressiva demonstração de fé a uma pessoa santa, um padre virtuoso que morreu com a punição de suspensão das ordens declarada pela Igreja, da qual nunca se afastou", diz.
Para Daniel, ele está canonizado pelo povo e a própria Igreja sabe disso. "Ela não é cega", afirma. Até hoje, segundo ele, seus devotos esperam ansiosamente pela sua reabilitação, cujo processo se arrasta na burocracia do Vaticano. "Pode ser que agora, com o novo Papa, surja uma nova esperança", aposta.
"Padre Cícero é uma das personalidades mais festejadas que conheço. Até no aniversário de morte, dia 20 de julho", diz.
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