Brasília. Mesmo o Planalto tendo escalado três ministros para negociar até o último momento, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) impôs ontem mais uma derrota ao governo Dilma Rousseff (PT).
Após impasses, negociações de última hora e reviravoltas nas posições partidárias, a maioria dos deputados aprovaram na noite de ontem um conjunto de emendas que estende a terceirização a todas as atividades de uma empresa e que diminui a arrecadação do governo federal. O texto tem de passar ainda pelo Senado.
Foram 230 votos a favor da nova redação, 203 contra e quatro abstenções. Entre os parlamentares cearenses, houve 11 votos não, seis votos sim e uma abstenção. Quatro votos não foram computados: Chico Lopes (PCdoB), Macedo (PSL), Odorico Monteiro (PT) e Vitor Valim (PMDB). O deputado Chico Lopes chegou a fazer uma reclamação durante a sessão de que seu voto não havia sido computado, o que foi registrado em ata.
A Emenda Aglutinativa n° 15, texto apresentado pelo deputado Arthur Maia (SD-BA), com apoio do PMDB de Cunha, contraria o Palácio do Planalto, que perdeu apoios relevantes como o do PSDB, legenda que estava dividida até a semana passada, mas que ontem orientou sua bancada a votar favoravelmente às emendas.
De nada adiantaram os apelos feitos pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, até poucos minutos antes da sessão. O Planalto deslocou, além de Levy, os ministros Ricardo Berzoini (Comunicações) e Eliseu Padilha (Aviação Civil) para defender seus interesses.
Eles estiveram reunidos com o presidente da Câmara por cerca de uma hora e meia antes do início da votação. Para Cunha, a aprovação do projeto não vai provocar perdas de receitas à União. "Ninguém está preocupado ou tem a tentativa de reduzir aquilo que o governo possa ter de arrecadação", afirmou
Histórico
Na semana passada, o presidente da Câmara havia sido obrigado a recuar e adiar por uma semana a votação das emendas para evitar que um requerimento apresentado pelo PSD, para retirada da matéria de pauta, fosse aprovado com apoio do PT e de parte do PSDB.
Depois da intervenção do presidente do PSDB, Aécio Neves (MG), os tucanos voltaram a apoiar o texto-base do projeto, que permite terceirizar inclusive as atividades-fim. A principal mudança defendida por Levy ficou de fora. Ele tentou incluir a tributação de 5,5% sobre o faturamento de companhias para financiamento do INSS.
O relator, no entanto, não cedeu e os deputados aprovaram a manutenção da tributação como está hoje, com alíquota de 20%, mas sobre a folha de pagamentos. A arrecadação seria maior sobre o faturamento, mesmo com alíquota inferior.
Apesar da derrota final, Levy já tinha conseguido inserir uma mudança tributária importante: a redução de 9,25% para 3,65% na alíquota do PIS/Cofins que as empresas poderão usar como crédito tributário na contratação de serviços terceirizados.
Pelo texto aprovado, as atividades-fim (função principal de uma empresa) poderão ser terceirizadas. Hoje, a legislação permite apenas que atividades-meio sejam terceirizadas, por exemplo, os serviços de limpeza e de segurança em um banco.
Além disso, cooperativas podem ser contratadas como empresas terceirizadas. Também foi reduzida de 24 para 12 meses a carência mínima para que um trabalhador, hoje com carteira assinada, possa retornar à empresa como terceirizado.
A emenda aglutinativa aprovada ontem também permite a "quarteirização", a subcontra- tação de uma empresa por uma outra empresa terceirizada.
O PT era o principal opositor à extensão da terceirização às atividades-fim. A atuação do governo, no entanto, foi focada nas questões fiscais. O relator do texto disse que o governo negociou somente questões tributárias.
"Nada sobre a questão de mérito do projeto, sobre as atividades-fim ou qualquer outro tema", disse Maia. O governo vê com bons olhos a regulamentação da terceirização, mas internamente admite preocupação com o risco de "pejotização" que o projeto pode ampliar. Isto é, os trabalhadores hoje com carteira assinada serem trocados por um contrato de Pessoa Jurídica (PJ).
Ainda na noite de ontem, os deputados discutiram outras três emendas ao projeto, que seguirá agora para a apreciação do Senado. Isso aconteceu porque a aprovação da emenda a aglutinativa prejudicou outras emendas apresentadas anteriormente.
Em relação à sindicalização, fica mantido o trecho do texto-base que prevê a filiação dos terceirizados ao mesmo sindicato da contratante apenas se ambas as empresas pertencerem à mesma categoria econômica. Entretanto, a emenda retira a necessidade de se observar os respectivos acordos e convenções coletivas de trabalho.
Quanto à responsabilidade da contratante, a emenda torna solidária a responsabilidade da contratante em relação às obrigações trabalhistas e previdenciárias devidas pela contratada. Assim, o trabalhador pode processar tanto a contratada quanto a contratante.
Críticas
Ontem, o líder do DEM, deputado Mendonça Filho (PE) criticou a repercussão que a aprovação do PL 4330 gerou. "Esse é um tema que ganhou dimensão negativa em determinado momento. Mas, por outro lado, nos últimos dias, a razão prevaleceu".
Já o líder do PT na Câmara, deputado Sibá Machado (AC), destacou que é preciso levar em conta dois pilares sobre o projeto. Um trata dos cerca de 12 milhões de trabalhadores terceirizados que podem obter mais direitos trabalhistas com a aprovação do PL e outro, dos cerca de 35 milhões de trabalhadores formais que podem se tornar terceirizados. "É aí que está o nosso ponto de discordância", criticou.
Brasília. Deputados da base governista criticaram ontem a emenda apresentada pelo relator do projeto da terceirização (PL 4330/04), deputado Arthur Maia (SDD-BA), e pelo líder do PMDB, deputado Leonardo Picciani (RJ). Entre outras mudanças, a emenda reduz de 24 para 12 meses o tempo de carência para que o ex-empregado da terceirizada volte ao criar uma nova empresa, na chamada "pejotização" (em referência à sigla de pessoa jurídica - PJ).
"Queremos transformar celetistas em PJ. O projeto original falava em 24 meses e, agora, está em 12. Vai facilitar a burla do projeto legítimo da terceirização", criticou ontem o líder do PDT, deputado André Figueiredo (CE).
A líder do PCdoB, deputada Jandira Feghali (RJ), afirmou que a mudança vai favorecer a contratação de pessoas jurídicas e precarizar os direitos dos trabalhadores. O líder do PT, deputado Sibá Machado (AC), também se manifestou contra a emenda.
"Deve ter uma quarentena para que a empresa não volte a contratar o empregado terceirizado como PJ", disse.
Derrota
O líder do governo, deputado José Guimarães (PT-CE), disse que a aprovação da emenda que altera pontos do PL 4330/04 não foi uma derrota para o governo. A orientação governista era pela rejeição da emenda, que passou com 230 votos. "Acho que foi o momento alto, eu perdi a votação, mas estou muito feliz porque cada um aqui expressou sua opinião", disse.
Segundo Guimarães, a votação apertada reforça a necessidade de mais diálogo do governo com a base aliada. "Cada um que votou assumiu responsabilidade sobre o conteúdo e o mérito da matéria. São legítimas as posições da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) na pressão sobre os parlamentares. E também são legítimas as pressões das centrais sindicais", afirmou ontem o líder do governo.
Visões distintas
A Central Única dos Trabalhadores (CUT) acusou a Câmara, em seu site oficial, de ter virado "as costas ao trabalhador" por causa da aprovação do projeto de terceirização. Já a Fiesp, criou um hotsite para defender as alterações previstas na proposta.
Imprecisão de emenda do PSDB gera polêmica
Brasília. A Câmara aprovou também a emenda nº 18 apresentada pelo PSDB como parte do projeto de lei regulamentando a terceirização no País (PL 4.330/2004), que define que trabalhadores terceirizados da administração pública e de sociedades de economia mista sejam beneficiados com os direitos da nova legislação, como as mesmas condições de alimentação, transporte e atendimento médico dos empregados da contratante. Foram 257 votos a favor, 38 contrários e 33 abstenções.
O texto da emenda tucana, contudo, não detalhava que tipo de direitos seriam. A imprecisão recebeu críticas de partidos da base. "A interpretação do que serão os direitos pode ser duvidosa", disse o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ)
A indefinição gerou confusão, com o PCdoB e o PDT ameaçando abandonar o plenário se a emenda se mantivesse em votação. Esses partidos, juntamente com Pros e PSOL passaram, então, a obstruir a votação. O PT e o PSB orientaram pelo voto contrário à emenda.
O deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) chamou a emenda de "monstrengo". De acordo com o parlamentar, o PSDB criou uma divisão para que as empresas públicas não fossem submetidas à lei 4.330.
Medida não pode ser 'irrestrita'
Brasília. O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), afirmou que a Casa vai analisar o projeto que trata da terceirização com "maturidade". Para ele, tal regulamentação não pode ser "ampla, geral e irrestrita". "Se ela (terceiri- zação) atingir 100% da atividade-fim, estará condenando essas pessoas todas à supressão de direitos trabalhistas e sociais", disse, ao ressaltar que foi o PMDB quem incluiu na Constituição o artigo V, que trata, entre outros, do direito ao trabalho.
Os deputados aprovaram, entre outros pontos, destaques sobre a extensão da terceirização às atividades-fim - a principal atividade da empresa. Para Renan, o PMDB não pode concordar com uma regulamentação da prática ampliada. Segundo ele, a medida tem que aumentar a segurança jurídica e precisa ter um limitador ou um percentual para que empresas realizem esse tipo de contratação. "Ela (a terceirização) tem que caracterizar muito bem o que significa atividade-fim", completou.
Fundo partidário
Ontem, o presidente do Senado avaliou que a presidente Dilma Rousseff errou duplamente ao sancionar o aumento do fundo partidário - de R$ 289,5 milhões para 867,5 milhões - e ao mesmo tempo anunciar que os recursos podem ser contingenciados. Para ele, não houve "debate suficiente" sobre o assunto.
AUTOR: DN
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