Era para ser uma quinta-feira normal. No último dia 20 de março, a dona da casa saiu para trabalhar. O filho mais velho também. As duas filhas caçulas da família foram para a escola. Somente um dos quatro filhos ficou em casa, dormindo.
O sono foi interrompido pelo pai, que lhe puxava uma das pernas. "Sai daqui, que a casa está pegando fogo". Atordoado, o jovem tentou, em vão, preservar os móveis. Com algum custo, conseguiu salvar a própria vida. O pai, que o acordou, confessou. "Toquei fogo na casa para matar sua mãe". O homem estava proibido pela Justiça, através de medida protetiva, de se aproximar do local. Tinha de manter uma distância de 100 metros da esposa por agressões e ameaças.
O filho, que escapou de sucumbir sob os escombros da residência, ainda evitou que o homem fugisse. "Ele passou por um policial, e eu disse que o prendesse. Era meu pai, mas era também o homem que tinha posto fogo na minha casa", relatou.
Graças à ineficácia da medida protetiva, a família agora teme pelo futuro. "Não sei como vai ser o dia em que ele sair da cadeia, se é que vai sair de lá", desabafa a mulher.
O número de mulheres assassinadas no Ceará tem crescido a cada ano. Conforme dados da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), em 2010, foram 182 vítimas da violência. Em 2011, 184 óbitos foram registrados. Em 2012, foram 212 mulheres assassinadas. Ano passado, o número cresceu para 267. Em 2014, nos primeiros dois meses do ano, a SSPDS já contabilizou 48 vítimas.
Boletins
De janeiro a março do ano passado, foram 2.662 casos de violência doméstica contra mulheres registrados somente em Fortaleza, segundo o Observatório de Violência Contra a Mulher (Observem), da Universidade Estadual do Ceará. Ao todo, o ano de 2013 contabilizou 9.980 casos. Em 2012, nos três primeiros meses do ano, foram registrados 2.578 boletins de mulheres vítimas da violência. Aquele ano terminou com a marca de 10.401 registros deste crime.
Em 2014, o Observem já catalogou 629 casos somente em janeiro. Desde agosto de 2013, quando 854 casos foram registrados, os números de ocorrência vêm em decrescente.
Para o promotor do núcleo de gênero pró-mulher do Ministério Público de Fortaleza, Anaílton Diniz, os números são alarmantes e necessitam de cuidados para que a Lei Maria da Penha, sancionada em 2006, possa ter efetividade. "A Lei é desafiadora, pois veio para mudar uma cultura, do homem que bate na mulher", diz.
Atenção
De acordo com ele, há a necessidade de maior atenção do Estado para combater com eficiência a violência no lar, inclusive ampliando o número de delegacias especializadas e juizados. Ele considera corriqueiro o arrependimento de denúncias aos agressores e a retirada das queixas por parte das mulheres, muitas vezes pressionadas pela família do agressor e pelo próprio agressor, dificultando os trabalhos de investigação policial.
"O limite dela de pedir para soltar o agressor é estreito. Ela não pode desistir de uma lesão corporal. Mesmo que ela não queira processar o agressor, o Estado é obrigado a processá-lo", recomenda.
Contudo, na opinião do membro do Ministério Público, o maior furo de toda a ação combatente à violência doméstica está na ressocialização dos agressores. "É preciso um centro permanente para reeducação do homem agressor", ponderou. Para o promotor, a violência doméstica é responsável, também, pela disseminação da violência urbana. "Tratam a violência doméstica com descaso, quando deveria ser a primeira preocupação da sociedade e do Estado", diz.
Mais informações
Delegacia de Defesa da Mulher
Rua Manuelito Moreira, 12, Benfica
Telefone para denúncias: 180
AUTOR: DN
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