Uma acusada de chefiar um esquema que busca travestis no Ceará e Pará para serem explorados no estado de São Paulo foi interrogada pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Tráfico de Pessoas nesta quinta-feira(29). Telma Rodrigues do Nascimento foi presa após o desmantelamento de uma rede descoberta em fevereiro de 2011 pela Polícia Civil paulista.
Ela responde pelos crimes de facilitação à prostituição e rufianismo, que significa exploração para obtenção de lucro por meio da prostituição alheia. Telma, que obteve liberdade provisória, concedida pelo juiz Eduardo Pereira dos Santos Júnior, aguarda julgamento do caso.
Segundo relatos dos travestis que denunciaram Telma, a acusada obrigava que as vítimas fizessem uma quantidade mínima de programas, além de castigá-las fisicamente. Telma também seria responsável por intermediar cirurgias feitas por “bombadeiras” (pessoas que vendem serviços de aplicação clandestinas de silicone, muitas vezes utilizando silicone industrial).
Interrogatório
Acompanhada pela advogada Adriana Criniti, a acusada respondeu às perguntas do presidente da CPI, deputado federal Arnaldo Jordy (PPS-PA). Telma defendeu-se das acusações dizendo que apenas tinha duas pensões, mas não explorava as travestis. “Eu tenho a pensão, mas eu alugo vagas. Eu não faço nada de mandar buscar ninguém. O que eles [travestis] fazem da porta para fora, eu não posso fazer nada”, disse.
Na operação da Polícia Civil que culminou na descoberta do esquema comandado por Telma, uma das pensões, localizada na Rua Hermínio Lemos, 340, abrigava seis adolescentes e 20 adultos. Telma, porém, negou a existência desse número de menores de idade em sua pensão, admitindo que apenas um deles poderia ter menos de 18 anos, mas que ela teria sido enganada por um documento falso. “O adolescente que aparece no inquérito ficou na minha casa sim, mas estava com documento falso”, disse.
A residência, de acordo com Telma, tem três quartos, onde 15 travestis ocupavam beliches e pagavam R$ 20 por uma diária que dava direito à alimentação e hospedagem. A acusada disse que adquiriu o imóvel que pertencia a um homem, ao qual se referiu apenas por “Alemão”. Telma teria pago R$ 6 mil pela casa, já que seria um imóvel invadido e ela teria ficado com a residência por quatro meses.
A outra pensão, localizada em uma esquina da Rua Santa Efigênia, segundo Telma, tem dois quartos e, nela, ficam sete travestis. A propriedade é alugada por Telma por um valor de R$ 1 mil e a cobrança da diária feita aos hóspedes é R$ 30. “Esse negócio de falar que eu ganho dinheiro com a prostituição, eu não ganho. Ganho com a moradia”, defendeu-se.
Os programas sexuais feitos pelos travestis, segundo a acusada, também não ocorriam dentro das suas pensões. “Lá na pensão não entra homem. O que eles [travestis] fazem da porta para fora é problema deles. Eu não sei o que fazem”, disse Telma.
Acusada em contradição
Telma negou que participasse de um esquema de recebimento de comissões em operações plásticas. “Se fizesse isso eu teria dinheiro. Eu não tenho dinheiro, eu não tenho carro, não tenho nada. Eu vivo das minhas costuras”. Ela declarou que indicou apenas a uma das travestis, citada como Emanuele, um cirurgião chamado Jair, que atende no bairro Santa Cruz. Emanuele desejava colocar silicone nos seios.
A acusada disse que conheceria Jair em função de uma plástica que teria interesse em fazer, no nariz. “Não fiz porque tenho medo de injeção”, disse. Ao longo do depoimento, no entanto, Telma entrou em contradição e acabou admitindo que levou outros travestis a esse cirurgião.
Para o presidente da CPI, essa não foi a única contradição nas respostas de Telma. “O depoimento dela é torrencialmente farto de contradições. Ela, na minha opinião, complicou-se em várias situações”, disse. Segundo Jordy, o esquema de Telma, que torna jovens reféns de uma condição de aliciamento, no qual os travestis chegam ao seu destino como devedores, faz parte de uma rede com possíveis ramificações internacionais.
A delegada da Polícia Civil da 1ª Delegacia de Proteção à Pessoa (DPP), Nilze Scapulatiello, disse que o nome de Telma constava em vários inquéritos. Ela constatou relatos muito semelhantes das vítimas, como o depoimento de um travesti feito à delegada: “A Telma que me trouxe para cá, ela me deu dinheiro. Se eu fico doente, tenho que trabalhar. Se não trabalhar todos os dias, eu fico para fora. Se eu não trabalho, sou espancado”. Os inquéritos apontavam, de acordo com ela, a responsabilidade de Telma no transporte das vítimas, no trabalho sexual forçado e nos espancamentos.
AUTOR: Jangadeiro
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