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quarta-feira, 25 de março de 2015

ANTES DE MATAR VIZINHA, PM AMEAÇOU CHACINA, EM SP

Jurema e a nora Gabriela (Foto: Reprodução/TV Globo)

Mais de um ano antes de matar a vizinha, balear uma grávida e um adolescente, o policial militar Gilson Teixeira de Souza, de 31 anos, ameaçou cometer uma chacina com a família das vítimas, segundo boletim de ocorrência da Polícia Civil de São Paulo.

À época, o cabo também apontou uma arma para a mulher que acabou morta a tiros por ele nesta semana na Zona Norte da capital. Ela era a advogada Jurema Cristiane Bezerra da Silva, de 39. Ele, que estava de folga, fugiu, mas se apresentou à uma delegacia, onde confessou a discussão e os disparos. Preso em flagrante, foi levado ao presídio da Polícia Militar, o Romão Gomes.

A desavença entre Gilson e a família de Jurema, que se conheciam desde a infância, começou depois que uma irmã do PM invadiu uma residência da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), também na Zona Norte. A casa, no entanto, deveria ter sido entregue pela CDHU a uma sobrinha de Jurema, que tem um filho com necessidades especiais. Depois disso a vizinha começou a ser alvo de ameaças.

A ameaça de uma "chacina" foi relatada pelo vendedor Luiz Carlos Bezerra da Silva, 34. Ele é irmão de Jurema, e deu a declaração em 1º de dezembro de 2013 - cinco dias após o PM impedir reintegração de posse da casa da CDHU.

“O autor ainda ameaçou dizendo 'que se caso a Justiça der direito a familiares da vítima em ficar com o imóvel, ele iria realizar uma chacina e sumiria, não iriam ter paz'”, informa o registro de ameaça relatado por Luiz no fim de 2013 no 73º Distrito Policial, no Jaçanã. O G1 não conseguiu localizar a defesa de Gilson para comentar o assunto.

Família destruída por crime
Gilson, que é cabo do 5º Batalhão da Polícia Militar (PM), matou Jurema no último domingo (22), após uma nova discussão envolvendo a disputa da residência da CDHU na Rua Manoel Lisboa de Moura.

O policial ainda baleou a nora de Jurema, Gabriela Leite Rocha, 18, grávida de seis meses, e o irmão da advogada, um garoto de 17 anos. Como Gabriela foi atingida na barriga e no rosto, teve de ser submetida a uma cesárea. Mãe e filha, que recebeu o nome da avó morta, estão internadas no Hospital São Luiz Gonzaga. O bebê está na Unidade de Terapia Intensiva (UTI).

O adolescente foi ferido de raspão na costela. Jurema foi enterrada nesta terça-feira (24) no cemitério da Vila Formosa. Ela era casada e deixou cinco filhos.

Outra queixa: arma apontada
Jurema também já havia sido ameaçada e agredida por Gilson e pela irmã dele em 13 de agosto de 2013, segundo ocorrência registrada pela própria vítima. Naquela ocasião, a advogada ajudava a sobrinha na mudança para o imóvel invadido pela irmã do PM. Um funcionário da CDHU estava presente para garantir a saída da invasora e o ingresso da verdadeira dona da casa.

“Aqui você não vai entrar”, teria dito Gilson apontando a arma para Jurema, segundo ela relatou à época na delegacia. A advogada ainda informou que a irmã do policial a agrediu com um soco. A própria CDHU confirmou que o cabo ameaçou um funcionário da companhia naquela ocasião e, por isso, registrou um boletim de ocorrência contra o policial.

Segundo a família das vítimas, cinco boletins de ocorrência por ameaça foram registrados, no total, contra Gilson. A equipe de reportagem teve acesso a dois deles, citados acima.

Discussão derradeira
Na opinião dos parentes de Jurema, se as autoridades tivessem ouvido a vizinha e tomado alguma medida protetiva contra as ameaças de Gilson, o cabo não teria cometido o crime que eles temiam. Por volta das 18h40 do domingo passado, um dos filhos da advogada conversava na rua da casa da avó quando o policial, que estava de folga e sem uniforme, passou num Fiat Palio e teria tentado atropelar o homem. Na confusão, a mulher dele, Gabriela, que estava grávida, foi até a rua com o filho de um ano no colo.

Testemunhas disseram que Gilson deu a volta no quarteirão e passou novamente na frente da residência. Em seguida, Jurema apareceu. Ela estava na casa da mãe, preparando ovos de Páscoa. A avó do rapaz também surgiu e as duas mulheres começaram a discutir com Gilson.

Se dizendo orientada pela Corregedoria da PM, que inocentou Gilson das denúncias de ameaças feitas pela família de Jurema, a advogada começou a gravar imagens do policial como provas da conduta ilegal dele. Na sequência, ele deu marcha à ré, tentando atropelar a mulher, que caiu no chão.
Então Gilson teria descido do carro e atirado no peito de Jurema. Depois deu mais dois tiros na advogada, segundo testemunhas. Um dos filhos da vítima jogou uma pedra que quebrou o para-choque do automóvel do policial. No revide, o PM atirou mais vezes e baleou de raspão o irmão de Jurema. Outros disparos atingiram Gabriela.

Gilson escapou e depois foi preso. Jurema morreu quando foi levada ao hospital. Gabriela teve de fazer um parto de emergência e o adolescente acabou medicado. Mãe e o bebê continuavam internados na tarde desta terça-feira. De acordo com parentes das vítimas, o estado de saúde de Gabriela é estável, mas o da criança seria grave.

Processos judiciais
O G1 localizou dois processos judiciais contra Gilson. Um deles, de ameaça contra Jurema, corria sob segredo de Justiça. Outro, também de ameaça, provavelmente contra foi extinto.

Por meio de nota, a Secretaria da Segurança Pública (SSP) informou que “o policial militar vai responder criminalmente pelo homicídio doloso na Justiça comum e será expulso da corporação assim que o inquérito policial militar relacionado ao caso” for concluído.

A pasta ainda informou que o boletim de ocorrência de ameaça e lesão corporal de Jurema contra o PM e a irmã dele se tornou inquérito policial e aguarda o depoimento de testemunhas.

A secretaria esclareceu que "a Corregedoria da Polícia Militar abriu uma sindicância em setembro de 2013 para apurar denúncia da família da vítima de que o PM havia ameaçado e apontado uma arma para ela. O trabalho foi encerrado em novembro do mesmo ano, com a orientação de abertura de procedimento disciplinar no 9º BPM/M, onde o PM estava lotado. 

A versão da família foi contestada por testemunhas que afirmaram que não houve ameaça do policial e que ele não sacou uma arma. A conclusão da sindicância, portanto, foi de que não havia elementos para a punição do policial."

AUTOR: G1/SP

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