sexta-feira, 28 de fevereiro de 2025

NO CEARÁ: FACÇÕES REALIZAM "LICITAÇÃO" PARA PROVEDORES DE INTERNET E DEIXAM MORADORES SEM SERVIÇOS DE EMPRESAS "PROIBIDAS"

Veículo de operadora de internet foi incendiado no bairro Jacarecanga, no último sábado (22). Polícia suspeita que o ato tenha sido criminoso Foto: Reprodução

As organizações criminosas continuam a interferir na economia, além de cometer crimes como homicídios e tráfico de drogas, no Ceará. A facção carioca Comando Vermelho (CV) avançou no controle do provedor de internet que os moradores devem utilizar, o que está sendo denominado de "licitação" (em analogia ao procedimento legal realizado pelo Poder Público); e proibiu o acesso de empresas a algumas regiões, na Capital e no Interior, nas últimas semanas.

O Diário do Nordeste recebeu relatos de moradores de pelo menos quatro bairros de Fortaleza - Carlito Pamplona, Farias Brito, Pirambu e Sapiranga - que ficaram sem internet porque a facção que domina a região proibiu a entrada de funcionários das empresas para corrigir problemas técnicos ou realizar novas instalações elétricas. A prática criminosa é registrada no Estado desde, pelo menos, o ano de 2020.

A Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Ceará (SSPDS) foi demandada de entrevista sobre as denúncias, mas a Pasta se manifestou por nota para informar que "a Polícia Civil do Estado do Ceará (PCCE), por meio da Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco) e com o apoio da Coordenadoria de Inteligência (Coin) da SSPDS, realiza investigações e diligências no intuito de identificar a atuação de grupos criminosos contra provedores de internet. A investigação transcorre sob segredo de Justiça e mais informações serão repassadas em momento oportuno, no intuito de não prejudicar as diligências policiais".

Professor da Universidade Federal do Ceará (UFC) e pesquisador do Laboratório de Estudos da Violência (LEV), o sociólogo Luiz Fábio Paiva analisa que "as facções têm se movimentado, de fato, na perspectiva do controle territorial. Esse controle, durante muitos anos, foi associado ao tráfico de drogas e de armas, mas o que a gente observa hoje é uma gestão de outros negócios, relacionados a água, internet, comércios, e esquemas de lavagem de dinheiro que, muitas vezes, estão estruturados nesse próprio processo de controle de determinados negócios regulares".
Controle dos provedores de internet, por facções criminosas, acontecem desde, pelo menos, o ano de 2020, no Ceará Foto: Arte/ Diário do Nordeste

Dois veículos de operadoras de internet pegaram fogo em Fortaleza, neste mês de fevereiro. A principal suspeita da Polícia é que os incêndios tenham origem criminosa, motivada pelo controle das facções ao acesso das empresas.

Um carro da empresa Brisanet foi incendiado no bairro Jacarecanga, no último sábado (22). E outro automóvel foi incendiado na Avenida Tenente Lisboa, bairro Presidente Kennedy, no dia 3. Um terceiro veículo teria sido tomado por criminosos, para ser incendiado, mas acabou sendo abandonado, no bairro Carlito Pamplona.

Um morador do Carlito Pamplona, que pediu para não ser identificado, afirmou à reportagem que ficou sem internet por cerca de três dias, porque as fiações foram cortadas por criminosos. Depois, o serviço foi normalizado. Entretanto, vizinhos foram proibidos de usar outra operadora. A facção que atua na região estaria exigindo que os moradores contratassem uma certa empresa.

9 dias foi o período que um morador do bairro Farias Brito ficou sem internet. Ao questionar à Brisanet qual o motivo da demora do restabelecimento do serviço, a empresa respondeu, por uma rede social, que "foi confirmado com o setor responsável que de fato não será possível realizar mais nenhum atendimento na sua localidade. Justamente por não liberarem a entrada da nossa equipe".

Um morador da Sapiranga também teve o mesmo problema, no início do mês de fevereiro. A informação que ele obteve foi que a empresa estava proibida de trabalhar na região.

A empresa Brisanet confirmou, por nota, que "vem enfrentando problemas de segurança pública em determinadas regiões de Fortaleza (CE)" e garantiu que "prioriza a proteção de seus empregados e tem tomado, internamente, medidas preventivas para garantir a integridade física dos colaboradores. Adicionalmente, está estudando maneiras de restabelecer serviços prejudicados. A Brisanet segue acompanhando de perto a situação, tendo como prioridade a segurança de seus empregados e clientes".

Ameaças a empresários

Moradores do bairro Pirambu receberam mensagens que "a empresa que ganhou a licitação do CV para atender a área com serviço de internet já irá repassar a taxa extra para o consumidor". O valor da conta irá aumentar R$ 10, a partir do mês de março. Fontes ouvidas pela reportagem explicaram que a "licitação" é um valor pago por empresas às facções para ter autorização para atuar nas regiões.

"Se a operadora quiser funcionar, tem que pagar um pedágio. Quem não paga, eles vão na caixa de distribuição e quebram, botam os funcionários da operadora para correr, incendeiam os carros", confirmou uma fonte da Inteligência da SSPDS.

O Diário do Nordeste recebeu também relatos de que empresários, proprietários de operadoras de internet, foram ameaçados e obrigados a pagar um valor para criminosos, para serem autorizados a funcionar em cidades da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), como Caucaia e São Gonçalo do Amarante; e do Interior do Estado, como Sobral.

Criminosos teriam cortado fios de internet e danificados aparelhos do servidor de uma empresa no Distrito de Pecém, em São Gonçalo do Amarante, na noite da última quarta-feira (26), o que prejudicou moradores da região e funcionários do Porto do Pecém a trabalharem, nesta quinta (27). Questionado sobre a denúncia, o Complexo do Pecém respondeu apenas que "operações no Porto do Pecém estão funcionando normalmente nesta quinta-feira (27). Houve apenas falhas pontuais no fornecimento de internet de algumas empresas".
Fiação foi cortada no Pecém, na noite da última quarta-feira (26), e moradores ficaram sem internet, na quinta (27). Ato teria sido realizado por uma facção criminosa Foto: Reprodução

A fonte da Inteligência da SSPDS afirmou que "os empresários das operadoras estão desesperados. Um perdeu três mil clientes e outro, mil clientes. Na região do Pecém, na Caucaia, estão rolando ameaças. No Pirambu, Quintino Cunha, está acontecendo isso de 'licitação'. Eles (empresários) não querem se render aos traficantes, porque entendem que assim vão se aliar à organização criminosa e que, depois, se não pagarem, podem até ser mortos".

Luiz Fábio Paiva observa que as facções passaram a se conectar "a negócios legais para a lavagem de dinheiro e também para a produção de recursos econômicos que vão sendo desenvolvidos". Segundo o sociólogo, o traficante passou a atuar como um empresário que "tem uma carta de negócios e vai administrando essa carta de negócios, de acordo com as probabilidades e as oportunidades que vão se apresentando".

Denúncias à Polícia

A Polícia Civil reforçou "a importância do registro de Boletim de Ocorrência (BO), por meio do qual podem ser repassadas informações que contribuam para as investigações policiais. O Boletim de Ocorrência pode ser registrado presencialmente, em qualquer unidade da PCCE, ou por meio da Delegacia Eletrônica (Deletron), disponível no site www.delegaciaeletronica.ce.gov.br, a qualquer hora do dia ou da noite. A Deletron atende todo o Estado do Ceará".

A população pode contribuir com as investigações repassando informações que auxiliem os trabalhos policiais. As informações podem ser direcionadas para o número 181, o Disque-Denúncia da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), ou para o (85) 3101-0181, que é o número de WhatsApp, pelo qual podem ser feitas denúncias via mensagem, áudio, vídeo e fotografia ou ainda via "e-denúncia", o site do serviço 181, por meio do endereço eletrônico: https://disquedenuncia181.sspds.ce.gov.br/."
Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Ceará
Em nota

A Pasta acrescentou que as denúncias também podem ser encaminhadas para o telefone (85) 3101-7591, número da Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco). O sigilo e o anonimato são garantidos pelo Estado.

FONTE: DN

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