Mais de 200 jovens entre 16 e 18 anos foram sequestradas pelo grupo em abril (Foto: AP)
No povoado de Chibok, no norte da Nigéria, a frase "a esperança é a última que morre" não significa nada. Para mais de 200 famílias de lá, a esperança já se perdeu – o que ainda permanece é a raiva pela impotência diante do que aconteceu há oito meses.
Foi em abril deste ano que 276 estudantes de uma escola local foram sequestradas por militantes do grupo extremista Boko Haram.
Mais de 50 tiveram oportunidade e coragem de escapar. O resto continua desaparecido, apesar das promessas do governo nigeriano de encontrá-las, dos drones americanos que foram espalhados para buscá-las pelo bosque de Sambisa e da megacampanha do Twitter, #BringBackOurGirls (na tradução, tragam de volta nossas meninas), que sensibilizou milhares de pessoas no mundo inteiro.
A esta altura, quem sabe do destino daquelas meninas? Existe ainda alguma possibilidade de encontrá-las? A BBC foi investigar.
O que aconteceu
Naquela noite de 14 de abril, um grupo de homens armados invadiu um internato público de Chibok – um local predominantemente cristão -, reuniu as jovens que tinham entre 16 e 18 anos em um auditório e começou a atear fogo aos dormitórios e salas do prédio.
"Vocês só vieram para a escola para se prostituir. A educação ocidental (Boko, em hausa) está proibida (haram, em árabe), então o que estão fazendo na escola?", perguntou um deles, segundo o relato ao serviço hausa da BBC de uma das estudantes que escapou.
Os homens ordenaram que elas buscassem seus sapatos e seus véus e subissem aos caminhões. Eles as levaram para o bosque de Sambisa, onde acredita-se que o Boko Haram tenha um esconderijo embaixo do Sahel – a zona de transição do deserto do Sahara para a savana do Sudão.
Muitas das meninas que conseguiram escapar fizeram isso saltando dos caminhões e contando com a ajuda de desconhecidos que deram uma carona para elas naquela região hostil.
Do resto, não se soube mais, até o dia em que o líder da organização, Abubakar Shekay, que tem 30 ou 40 anos e foi descrito como "parte teólogo, parte gângster", apareceu em um vídeo em meados de maio.
"Eu sequestrei suas filhas", disse. "Vou vendê-las no mercado, por Alá. Vou vendê-las e entregá-las ao matrimônio."
"A escravidão é permitida na minha religião. Vou capturar as pessoas e escravizá-las."
Cerca de 136 das jovens apareciam no vídeo. Vestidas dos pés à cabeça com o hijab muçulmano, sentadas e recitando o primeiro verso do Corão. Duas delas disseram ter se convertido ao Islamismo e deixado o Cristianismo para trás.
Desde então, elas nunca mais foram vistas.
Busca frustrada
O caso não escapou dos assuntos de política interna da Nigéria.
No início, o presidente Goodluck Johnatan negou que o sequestro havia ocorrido, como se falava na organização do Foro Econômico Mundial, que acontecia naqueles dias no país.
Depois, a ajuda internacional ficou sob suspeita. Em seguida, a campanha no Twitter foi considerada uma tentativa de desprestigiá-lo.
Em meio a tudo isso, informou-se que testemunhas tinham visto as jovens além da fronteira do país, em Camarões e no Chade. Um idoso disse ao serviço Hausa da BBC que várias delas tinham sido forçadas a se casar ou vendidas como escravas pelo equivalente a US$ 12 (cerca de R$ 32).
Em agosto, o jornal americano The Wall Street Journal afirmou que drones dos Estados Unidos avistaram grupos de mulheres no bosque de Sambisa. Isso sugeriu que o Boko Haram as mantinha como uma valiosa ferramenta de negociação para uma possível troca de prisioneiros.
No entanto, nada disso foi confirmado oficialmente.
Em outubro, um negociador britânico-australiano disse que outras quatro meninas conseguiram escapar e chegar a um lugar seguro após uma caminhada de três semanas. Uma trégua foi anunciada pelo governo naquele mês, que supostamente iria abrir a porta para a libertação das meninas, mas não deu em nada.
A última notícia que se teve do caso veio, mais uma vez, da boca de Abubakar Shekau que, em um vídeo divulgado em 1º de novembro, disse que o caso das jovens estava encerrado e esquecido. Isso porque há muito tempo elas haviam casado e se convertido para o Islã.
"Estão em suas casas com seus maridos", disse, rindo.
Respostas
Não há nenhuma resposta definitiva sobre o paradeiro e o destino dessas mais de 200 meninas nas mãos do Boko Haram.
"Não há nada que nos dê esperança", disse à BBC Mundo Isa Sanusi, jornalista do serviço hausa da BBC. "Não há nada de concreto, nenhuma informação de que estão tentando resgatá-las."
Um bloqueio imposto pelo governo da Nigéria sobre as informações do caso faz com que fique ainda mais difícil descobrir o que aconteceu com elas.
Sanusi afirma que é possível que muitas delas tenham se casado com os próprios militantes do Boko Haram, que as mantinham na selva como uma forma de evitar que o exército tentasse atacar a zona que o grupo controlava.
Outras haviam sido vendidas. É provável que algumas estejam grávidas ou mortas, como disse o ex-presidente nigeriano Olusegun Obansajo.
Nenhuma teria tido um final feliz.
Se elas voltarão? "O que pode acontecer é que, de pouco em pouco, alguma aproveite uma oportunidade para escapar ou que se consiga um acordo com determinada facção que tem algumas das reféns sob seu poder. Nos próximos meses ou anos, podem começar a reaparecer", disse um diplomata britânico não identificado citado pelo jornal The Telegraph em julho passado.
Enquanto isso, os pais e mães de Chibok seguem esperando. Sempre esperando. Decepcionados. Enfurecidos. Sem esperança.
AUTOR: BBC
No povoado de Chibok, no norte da Nigéria, a frase "a esperança é a última que morre" não significa nada. Para mais de 200 famílias de lá, a esperança já se perdeu – o que ainda permanece é a raiva pela impotência diante do que aconteceu há oito meses.
Foi em abril deste ano que 276 estudantes de uma escola local foram sequestradas por militantes do grupo extremista Boko Haram.
Mais de 50 tiveram oportunidade e coragem de escapar. O resto continua desaparecido, apesar das promessas do governo nigeriano de encontrá-las, dos drones americanos que foram espalhados para buscá-las pelo bosque de Sambisa e da megacampanha do Twitter, #BringBackOurGirls (na tradução, tragam de volta nossas meninas), que sensibilizou milhares de pessoas no mundo inteiro.
A esta altura, quem sabe do destino daquelas meninas? Existe ainda alguma possibilidade de encontrá-las? A BBC foi investigar.
O que aconteceu
Naquela noite de 14 de abril, um grupo de homens armados invadiu um internato público de Chibok – um local predominantemente cristão -, reuniu as jovens que tinham entre 16 e 18 anos em um auditório e começou a atear fogo aos dormitórios e salas do prédio.
"Vocês só vieram para a escola para se prostituir. A educação ocidental (Boko, em hausa) está proibida (haram, em árabe), então o que estão fazendo na escola?", perguntou um deles, segundo o relato ao serviço hausa da BBC de uma das estudantes que escapou.
Os homens ordenaram que elas buscassem seus sapatos e seus véus e subissem aos caminhões. Eles as levaram para o bosque de Sambisa, onde acredita-se que o Boko Haram tenha um esconderijo embaixo do Sahel – a zona de transição do deserto do Sahara para a savana do Sudão.
Muitas das meninas que conseguiram escapar fizeram isso saltando dos caminhões e contando com a ajuda de desconhecidos que deram uma carona para elas naquela região hostil.
Do resto, não se soube mais, até o dia em que o líder da organização, Abubakar Shekay, que tem 30 ou 40 anos e foi descrito como "parte teólogo, parte gângster", apareceu em um vídeo em meados de maio.
"Eu sequestrei suas filhas", disse. "Vou vendê-las no mercado, por Alá. Vou vendê-las e entregá-las ao matrimônio."
"A escravidão é permitida na minha religião. Vou capturar as pessoas e escravizá-las."
Cerca de 136 das jovens apareciam no vídeo. Vestidas dos pés à cabeça com o hijab muçulmano, sentadas e recitando o primeiro verso do Corão. Duas delas disseram ter se convertido ao Islamismo e deixado o Cristianismo para trás.
Desde então, elas nunca mais foram vistas.
Busca frustrada
O caso não escapou dos assuntos de política interna da Nigéria.
No início, o presidente Goodluck Johnatan negou que o sequestro havia ocorrido, como se falava na organização do Foro Econômico Mundial, que acontecia naqueles dias no país.
Depois, a ajuda internacional ficou sob suspeita. Em seguida, a campanha no Twitter foi considerada uma tentativa de desprestigiá-lo.
Em meio a tudo isso, informou-se que testemunhas tinham visto as jovens além da fronteira do país, em Camarões e no Chade. Um idoso disse ao serviço Hausa da BBC que várias delas tinham sido forçadas a se casar ou vendidas como escravas pelo equivalente a US$ 12 (cerca de R$ 32).
Em agosto, o jornal americano The Wall Street Journal afirmou que drones dos Estados Unidos avistaram grupos de mulheres no bosque de Sambisa. Isso sugeriu que o Boko Haram as mantinha como uma valiosa ferramenta de negociação para uma possível troca de prisioneiros.
No entanto, nada disso foi confirmado oficialmente.
Em outubro, um negociador britânico-australiano disse que outras quatro meninas conseguiram escapar e chegar a um lugar seguro após uma caminhada de três semanas. Uma trégua foi anunciada pelo governo naquele mês, que supostamente iria abrir a porta para a libertação das meninas, mas não deu em nada.
A última notícia que se teve do caso veio, mais uma vez, da boca de Abubakar Shekau que, em um vídeo divulgado em 1º de novembro, disse que o caso das jovens estava encerrado e esquecido. Isso porque há muito tempo elas haviam casado e se convertido para o Islã.
"Estão em suas casas com seus maridos", disse, rindo.
Respostas
Não há nenhuma resposta definitiva sobre o paradeiro e o destino dessas mais de 200 meninas nas mãos do Boko Haram.
"Não há nada que nos dê esperança", disse à BBC Mundo Isa Sanusi, jornalista do serviço hausa da BBC. "Não há nada de concreto, nenhuma informação de que estão tentando resgatá-las."
Um bloqueio imposto pelo governo da Nigéria sobre as informações do caso faz com que fique ainda mais difícil descobrir o que aconteceu com elas.
Sanusi afirma que é possível que muitas delas tenham se casado com os próprios militantes do Boko Haram, que as mantinham na selva como uma forma de evitar que o exército tentasse atacar a zona que o grupo controlava.
Outras haviam sido vendidas. É provável que algumas estejam grávidas ou mortas, como disse o ex-presidente nigeriano Olusegun Obansajo.
Nenhuma teria tido um final feliz.
Se elas voltarão? "O que pode acontecer é que, de pouco em pouco, alguma aproveite uma oportunidade para escapar ou que se consiga um acordo com determinada facção que tem algumas das reféns sob seu poder. Nos próximos meses ou anos, podem começar a reaparecer", disse um diplomata britânico não identificado citado pelo jornal The Telegraph em julho passado.
Enquanto isso, os pais e mães de Chibok seguem esperando. Sempre esperando. Decepcionados. Enfurecidos. Sem esperança.
AUTOR: BBC
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